quinta-feira, 3 de março de 2022

Terra De Santa Cruz



SagaraNAgens Fulinaímicas



guima meu mestre guima

em mil perdões eu vos peço

por esta obra encarnada

na carne cabra da peste

da hygia ferreira bem casta

aqui nas bandas do leste

a fome de carne é madrasta



ave palavra profana

cabala que vos fazia

veredas em mais sagaranas

a morte em vidas severinas

tal qual antropofagia

teu grande serTão vou cumer



nem joão cabral severino

nem virgulino de matraca

nem meu padrinho de pia

me ensinou usar faca

ou da palavra o fazer

a ferramenta que afino

roubei do meste drummundo

que o diabo giramundo

é o narciso do meu Ser


 ainda que seja assim

ainda que seja assado

 

não tenho papas na língua

não tenho  língua nas papas

 

quando me descobri ainda menino saltando muros para roubar mangas no quintal do vizinho ou quando o tasquei fogo no paiol de milho percebi a vida nos trilhos

 

tudo gira tudo rola

pomba gira no terreiro

trepada em pé de carambola

 

e lá vai terminando mais um ciclo ao redor do sol meu pai cavaleiro de Ogum

na terra girou 67 por onde anda não sei deve estar pelas galáxias nas festas de São João Xangô Menino

 

ela vinha

com um copo de vinho

na boca uma língua

de fome

no corpo a carne

sedenta

seis anos para ceder

aos instintos

e dar-me em camas

ela veio vestida de nada

enquanto pra ela escrevia

um bolero blue

 

no poema nada cabe

nem o que sei

nem o que não se sabe

 

que seja por um risco

que seja por um triz

a mulher que sempre amei

não era atriz

era aprendiz de arquiteta

sempre andou em linha torta

apesar de sempre ereta

 

teu corpo

é carne de manga

em meu pênis viril

enquanto sangra

quando beijo tua boca

enfurecido

rasgando por trás

o teu vestido

 

 

se tiver que me matar

que seja

se eu tiver que te matar

que morra

em cada beijo que te der

amando

só vale o gozo

quando for eterno

infernizando os céus

e santificando

a boca do inferno

 

com espada em riste

galopamos velozmente

por dois segundos e meio

tua fúria era tanta

que agarrei-me

em tuas crinas

para não cair na lama

mas o amor era tanto

e tanto era o prazer

que quando fomos pra cama

não tinha mais o que fazer

 

ainda que seja assim

ainda que seja assado

a carne seca com farinha

anda muito cara no mercado

 

nasceu uma erva santa em meu quintal nem sei quem jogou a semente se foi algum vizinho ou se foi trazida por passarinho

 

algumas coisas dançam na memória

outras passeiam ou passam e vão desfilar em outras vitrines no tempo do esquecimento

 

enquanto a bahia

se afoga

o genocida nada

 

quando escrevo

com enxada

o poema é mais real

 

uma mistura de cerveja campari vodka com limão picanha assada assim foi meu natal de 2021 para fechar esse ciclo em torno do sol vamos dançar para                                   Olorum no dia 31  

 

Ogum não permitiu

que Yansã doasse o coração

                           para Xangô

e deu-se num trovão

pela manhã o seu amor

Oxossi em cada um

 

moram dentro o mar

dois olhos florescentes

por trás desta paisagem

não são olhos de peixe

são dois feixes de luz

dois faróis brilhantes

que olham infinito

desde um tempo outro

mar de outras eras

nem era primavera

aquela vez primeira

nem era quarta feira

na sala de ensaio

diante dos espelho

dois olhos como raios

dentro os olhos meus

que acenderam o fogo

como queima agora

neste mar de Zeus

 

a lavra da palavra quero

quando for pluma

mesmo sendo espora

 

felicidade uma palavra

onde a lavra explora

se é saudade dói

mas não demora

e sendo fauna linda como a Flora

lua Luanda vem não vá embora

 

se for poema fogo do desejo

quando for beijo que seja como agora

 

a poesia é meta física

meta quântica

Itaipu é uma paraíso

dentro do que sobrou

da Mata Atlântica

 

o que existe

por trás da poesia

língua de sal

lambendo a pele  

do amor à flor da pele

toda pele maresia

 

Diador-in

avessa em mim

branquinha como a neve

me leve

para dentro da tua casa

a poesia é o infinito da pessoa

te empresto minhas asas

pare de caminhar  - e voa

 

Afiando a CarNAvalha

 

cocada agora

só se for de coco

paçoca de amendoim

 

cigarro só se for de palha

cacique só se for da mata

linguagem só tupiniquim

 

bala só se for de prata

água só se aguardente

tônica só se for com gim

 

estado só se for de surto

eleição só se for sem furto

brilho só no camarim

 

golaço só se for de letra

Ronaldo só se for Werneck

malandro só se mandarim

 

política só se for decente

partido só sem presidente

governo eu que mando em mim

 

batismo só se for de pia

Congresso só de Poesia

Reinaldo pode ser Valinho

ainda melhor se for Jardim

 

ela me chega assim bailarina

como um tarde de música

envolta em física quântica

etérea qual labirinto

 

para dizer o que sinto

e desvendar teu endereço

procuro em teu livro secreto

palavras que não conheço

 

 

Artur Gomes

na trilha do fogo

www.porradalirica.blogspot.com




o que dizer as

namoradinhas do crivella

as falsas donzelas

da abstinência sexual

o que dizer as ovelhinhas

do edir mais cedo

não tem segredo

:

não curto culto meu amor

não curto

sou um pastor afrotupy

prefiro o ritual dos barracões

para aplacar os meus vulcões

               em fases de erupções

encarnações como  eu nunca vi

 

bordel brazílico

 

no bordel brazílico

meio dia pós almoço

as putas dormem

 

nos seus recintos de respeito

as bichas dormem

pós desfiles carnavalescos

 

os deputados dormem

os senadores dormem

os prefeitos dormem

os vereadores dormem

os juízes dormem

 

todos na suprema corte dormem

só no gabinete do presidente

ele é o único acor(dado)

no tanto fez como tanto faz

e decreta mais um projeto

para desmatamento da amazônia

e leilão na Petrobras.

 

 

 mula sem cabeça

 

a besta fera

perdeu a cabeça

na esquina da W3

com asa norte

a encruzilhada do delírio

 

sua língua morta

foi decapitada

por Adélio Bispo do Rosário

foi encontrada na rota 666

ladeira do inferno

na praia da macumba

 

e agora exposta

no museu universal

das grandes novidades

salmo 2019 versículo 6.6

segundo o evangelho

 do Pastor de Andrade

 

a ovelha do oitavo andar

se desgarrou na madrugada

foi dar o leite para o padre

e me deixou na bronha

 

sujei a fronha

do meu travesseiro

sujei as mãos

sujei os dedos

e a sem vergonha

me ligou pra dar a deus

 

juro que não sou santo

juro que não sou zeus

se encontro essa ovelha

desgarrada

vai ter bordel

vai ter facada

 

e não venham me dizer

que é crueldade

sacanagem

é o que ela fez comigo

me deixou de quatro

e ainda cuspiu no meu umbigo

 

santíssima trindade

 

o pastor universal

      o narco tráfico

              e a milícia

 

uma santíssima trindade

no país do laranjal

 


mini conto - a faca

 poesia não é manchete de jornal para espremer escorrer sangue o poema pode ser facada sim que  entra na carne mas não sangra como aquela em juiz de fora que até agora ninguém me explicou o melodrama estava li e não vi adélio no curral do tal comício palanque armado para fazer do brasil uma quaderna - pra fazer do brasil um precipício

 

última ceia

 

do peixe vamos comer

somente espinha

na rapadura com farinha




 TERRA DE SANTA CRUZ

 

ao batizarem-te deram-te o nome

posto que a tua profissão

é abrir-te em camas

dar-te em ferro

 ouro prata

rios peixes

minas mata

deixar que os abutres

devorem-te na carne

o derradeiro verme.

 

salve lindo pendão que balança

entre as pernas abertas da paz

tua nobre sifilítica herança

dos rendez-vous de impérios atrás.

 

meu coração é tão hipócrita que não janta

e mais imbecil que ainda canta

ouviram no ipiranga às margens plácidas

uma bandeira arriada

num país que não levanta.

 

telefonaram-me

 avisando-me que vinhas

na noite

uma estrela ainda brigava

contra a escuridão

na rua sob patas

 tombavam homens indefesos

esperei-te vinte anos

e até hoje não vieste

à minha porta.

 

o poeta estraçalha a bandeira

raia o sol marginal quarta-feira

na geléia geral brasileira

o céu de abril não é de anil

nem general é mãe brazil.

 

minha verde e amarela esperança

portugal já vendeu para a frança

e o coração latino balança

entre o mar de dólares do norte

e o chão dos cruzeiros do sul.

 

o poeta esfrangalha a bandeira

raia o sol marginal sexta-feira

nesta zorra estrangeira e azul

que há muito índio dizia:

 

meu coração marçal tupã

 sangra tupy e rock’n’roll

meu sangue tupiniquim

 em corpo tupinambá

samba jongo maculelê

maracatu boi bumbá

a veia de curumim

é coca cola e guaraná.

 

o sonho rola no parque

o sangue ralo no tanque

nada a ver com tipo dark

muito menos com punk

meu vício letal é baiafro

com ódio mortal de ianque.

 

ó baby a coisa por aqui

não mudou nada

embora sejam outras

 siglas no emblema

espada continua a ser espada

poema continua a ser poema.

 

Artur Gomes

www.arturgumesfulinaima.blogspot.com

Do cd Fulinaíma – Sax, Blues e Poesia

Edição do autor, 2002

*****


eu sou umbanda

 

veja bem meu bem o beijo que não me deste era gelado e derreteu teu evangelho um sacrilégio  de um mitológico prometeu não gosto da palavra doce prefiro salamargo pra desintoxicar o fígado o sabor da minha língua é azeite sal pimenta se não agüenta sarta de banda eu sou umbanda vou pro terreiro de oxossi sacramentar o meu amor bater macumba na quimbanda e saravá xangô

 

 

Federika Lispector

eu não sou santa

www.braziliricapereira.blogspot.com



lascívia

 

do porto de Santos

ecoa o grito no Ipiranga

 

:

 

irreverência ou morte!

 

o vampiro está de tanga

no mar negro palácio jaburu

 

com a baba escorrendo na boca

e o guindaste enfiado no cu

 

sossegado no meu canto

conheci essas  meninas

no carnaval de iriri

que fica logo ali

do outro lado do espírito santo

 

juro que foi assalto

uma quadrilha invadiu

o palácio do planalto

 

 Pastor de Andrade

Fulinaíma Afro Tupiniquim

www.arturfulinaima.blogspot.com

 

 poética 2

 

o que tem essa mulher que me delira

o que tem essa mulher que me deleita

o que tem essa mulher que me provoca

o que tem essa mulher que me estreita

o que tem essa mulher que me espreita

leoa na selva que me caça

ou uma grande mulher quando se toca


eros

 

tua blusa de seda

entre meus dentes

o nó se desfez depois do vinho

sob as folhas dos parreirais

vale - os vinhedos

quantas vezes eros

eletrizou os nossos dedos?

 

FedericoBaudelaire

www.fulinaimicamente.blogspot.com



sarcasmo

 

o olho clínico não responde

fechou o livro na vigésima

sétima página

 

eu fico sem saber o que pensa

da minha crença no naturalismo

 

das coisas que ainda

não tem nome

se a fome é física

ou sobrenatural

 

tesão é química ou apenas

a parte mais intensa

de uma transa casual

 

como cavalo

cavalgo tua relva branca

como vassalo do teu corpo

florbela que ne espanca


confissão

 

em nome do pai

do filho e do espírito santo

confesso entretanto

que o meu jejum de hoje

tem almôndegas de soja

com vinho tinto de Bento

 

Salton Cave de Pedra

eu sei que Fedra Margarida

gosta mais de carne mesmo

cachacinha com torresmo

 

mas tenho fé que ela

passe a língua no meu linho

se embriague com meu vinho

coma da minha carne

e se engravide do meu pão 


sossegado no meu canto

conheci essas  meninas

no carnaval de iriri

que fica logo ali

do outro lado do espírito santo 

 

EuGênio Mallarmè

www.porradalirica.blogspot.com


Um Cidadão Comum

 

Sempre subindo a ladeira do nada,

Topar em pedras que nada revelam.

Levar às costas o fardo do ser

E ter certeza que não vai ser pago.

 

Sentir prazeres, dores, sentir medo,

Nada entender, querer saber tudo.

Cantar com voz bonita prá cachorro,

Não ver “PERIGO” e afundar no caos.

 

Fumar, beber, amar, dormir sem sono,

Observar as horas impiedosas

Que passam carregando um bom pedaço

da vida, sem dar satisfações.

 

Amar o amargo e sonhar com doçuras

Saber que retornar não é possível

Sentir que um dia vai sentir saudades

Da ladeira, do fardo, das pedradas.

 

Por fim, de um só salto,

Transpor de vez o paredão.

 

Torquato Neto


"Terra de Santa Cruz "  é foda, um épico, como poucos, muito poucos, da desgraça dessa nossa terra tão violentada. Para quem conhece a versão gravada, na voz de Artur Gomes, cruzada com o blues Noite Escura, de Reubes Pess, a publicação do poema no silêncio da escrita é uma redução drástica, mesmo que mantenha sua contundência cristalina e triste. Porra, ouça isso. As imagens são simples, a impressão é de que foi o que deu pra fazer. O que importa é a força do poema lançada como lava de vulcão bem dentro dos nossos ouvidos. Eis o link: https://www.facebook.com/studiofulinaima/videos/1366124026815847/?hc_ref=PAGES_TIMELINE

 

obs.: terra de santa cruz foi escrito na década de 1980 do século 20. Sua primeira publicação se deu no livro Couro Cru & Carne Viva – 1987 – republicado  2019 na antologia pessoal Pátria A(r )madaEditora Desconcertos, com prefácio de Ademir Assunção




 Personas ArturiAnas

www.personasarturianas.blogspot.com

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