Geleia Geral – Revirando A Tropicália
28 outubro ou nada - 2022 - 19h
Por onde andará Fulinaíma?
Elenco:
Artur Gomes + Adriano Moura + Aimèe Cisneiro + Aline Portilho + Christina Cruz + Joilson Bessa + Marcella Roza + Marcelo da Rosa + Serginho do Cavaco + Tchello d`Barros
Mostra Visual de Poesia Brasileira
Poesia em Movimento
o delírio
é a lira do poeta
se o poeta não delira
sua lira não profeta
leia mais no blog https://fulinaimacentrodearte.blogspot.com/
QUE PAÍS É ESTE?
Fragmento
Universidade Livre de Alvito
(Afonso Romano de Sant'Anna)
1
Uma coisa é um país,
outra um ajuntamento.
Uma coisa é um país,
outra um regimento.
Uma coisa é um país,
outra o confinamento.
Mas já soube datas, guerras, estátuas
usei caderno “Avante”
— e desfilei de tênis para o ditador.
Vinha de um “berço esplêndido” para um “futuro radioso”
e éramos maiores em tudo
— discursando rios e pretensão.
Uma coisa é um país,
outra um fingimento.
Uma coisa é um país,
outra um monumento.
Uma coisa é um país,
outra o aviltamento.
Deveria derribar aflitos mapas sobre a praça
em busca da especiosa raiz? ou deveria
parar de ler jornais
e ler anais
como anal
animal
hiena patética
na merda nacional?
Ou deveria, enfim, jejuar na Torre do Tombo
comendo o que as traças descomem
procurando
o Quinto Império, o primeiro portulano, a viciosa visão do paraíso
que nos impeliu a errar aqui?
Subo, de joelhos, as escadas dos arquivos
nacionais, como qualquer santo barroco
a rebuscar
no mofo dos papiros, no bolor
das pias batismais, no bodum das vestes reais
a ver o que se salvou com o tempo
e ao mesmo tempo
– nos trai
2
Há 500 anos caçamos índios e operários,
há 500 anos queimamos árvores e hereges,
há 500 anos estupramos livros e mulheres,
há 500 anos sugamos negras e aluguéis.
Há 500 anos dizemos:
que o futuro a Deus pertence,
que Deus nasceu na Bahia,
que São Jorge é que é guerreiro,
que do amanhã ninguém sabe,
que conosco ninguém pode,
que quem não pode sacode.
Há 500 anos somos pretos de alma branca,
não somos nada violentos,
quem espera sempre alcança
e quem não chora não mama
ou quem tem padrinho vivo
não morre nunca pagão.
Há 500 anos propalamos:
este é o país do futuro,
antes tarde do que nunca,
mais vale quem Deus ajuda
e a Europa ainda se curva.
Há 500 anos
somos raposas verdes
colhendo uvas com os olhos,
semeamos promessa e vento
com tempestades na boca,
sonhamos a paz da Suécia
com suíças militares,
vendemos siris na estrada
e papagaios em Haia,
nada nada congemina:
a senzalamos casas-grandes
e sobradamos mocambos,
bebemos cachaça e brahma
joaquim silvério e derrama,
a polícia nos dispersa
e o futebol nos conclama,
cantamos salve-rainhas
e salve-se quem puder,
pois Jesus Cristo nos mata
num carnaval de mulatas.
Este é um país de síndicos em geral
este é um país de cínicos em geral
este é um país de civis e generais.
Este é o país do descontínuo
onde nada congemina
e somos índios perdidos
na eletrônica oficina
Nada nada congemina:
a mão leve do político
com nossa dura rotina,
o salário que nos come e
nossa sede canina,
e a esperança que emparedam
a nossa fé em ruína,
placidez desses santos
e a nossa dor peregrina,
e nesse mundo às avessas
– a cor da noite é obsclara
e a claridez, vespertina.
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